terça-feira, 21 de fevereiro de 2017

FOTOGRAFA UM POEMA - poemas do mês de Fevereiro

Saudades de ti… aqui!
Maria Armanda Vasconcelos

Sabes-me às ondas salgadas de ontem,
Aquelas… que senti dentro do teu mar,
Aquelas que saboreei quando escorriam dos teus olhos…
Foi ontem…
Aquela eternidade onde senti a alma voar,
Lembras-te?
Bastava que os nossos olhares se cruzassem,
E a pele arrepiada dos nossos corpos
Saltava de nós para que as almas se tocassem,
Se amassem…
Enfurecíamos até o Diabo com tanto amor!
E a vida fora de nós deixava de existir, de ser…
E o tempo parava nas horas, como favor
À eternidade perfumada que nos via crescer…
Lembras-te?
Dos dias e as horas, dos momentos em que nos consumíamos.
E agora…?
A minha alma reclama a tua ausência,
Numa desmedida e perturbada saudade.
Numa dor aguda, inquieta… a carência,
De quem era inteira e agora incompleta,
Desta angústia que me mata de ansiedade…
Perdeu-se a eternidade, fica a minha alma inquieta.
Ai…! Que me queima a vida, esta saudade,
De ti, de mim, de tudo o que nos fazia existir!
Porque nos fez o destino esta maldade,
Esta cruel feitiçaria,
Que nos roubou os lábios que nos faziam sorrir…
Saudades de ti…
Todos os dias, aqui!

Maria Armanda Vasconcelos in Ecos do Apolo




Para escrever o poema
Nuno Júdice

O poeta quer escrever sobre um pássaro:
e o pássaro foge-lhe do verso.

O poeta quer escrever sobre a maçã:
e a maçã cai-lhe do ramo onde a pousou.

O poeta quer escrever sobre uma flor:
e a flor murcha no jarro da estrofe.

Então, o poeta faz uma gaiola de palavras
para o pássaro não fugir.

Então, o poeta chama pela serpente
para que ela convença Eva a morder a maçã.

Então, o poeta põe água na estrofe
para que a flor não murche.

Mas um pássaro não canta
quando o fecham na gaiola.

A serpente não sai da terra
porque Eva tem medo de serpentes.

E a água que devia manter viva a flor
escorre por entre os versos.

E quando o poeta pousou a caneta,
o pássaro começou a voar,
Eva correu por entre as macieiras
e todas as flores nasceram da terra.

O poeta voltou a pegar na caneta,
escreveu o que tinha visto,
e o poema ficou feito.

Nuno Júdice, in A Matéria do Poema


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